“Oh! Dá-me o livro. Por qualquer preço dá-me o livro de
Deus! Nele há conhecimento o bastante para mim. Deixe-me
ser o homem de um só livro”. – John Wesley
John Wesley nasceu em Epworth, Inglaterra, em 17 de junho de 1703, durante o reinado da boa rainha Anne. Foi o décimo quinto de uma família de dezenove filhos. Sua infância foi dirigida por sua mãe, Suzanna, uma mulher rígida e piedosa e seu pai, Samuel, um homem difícil de agradar. Sua mãe acreditava que os desejos das crianças deviam ser subjugados, que eles deveriam ser açoitados quando não se comportassem e que deviam chorar baixinho depois de açoitados. Ele teria morrido num incêndio em Epworth Rectory se não tivesse sido arrancado das chamas por um vizinho que subiu nos ombros de outro vizinho. Ele tinha seis anos então, e depois disso, sua mãe o lembrou várias vezes que ele era “um tição colhido do fogo”. Ela sentia – e mais tarde ele veio a sentir – que ele tinha sido poupado por um propósito, servir a Deus.
Samuel, o pai de John, era um erudito, que por muitos anos trabalhou numa obra monumental sobre o livro de Jó. Um pregador severo, para não dizer implacável. Com seu pai e sua mãe, John Wesley desenvolveu excelentes hábitos de estudo e também se acostumou com sofrimento físico.
Com dezessete anos ele começou estudar teologia na faculdade de Oxford, e recebeu sua diploma de bacharel em 1724 e doutorado em 1727. Foi consagrado ministro da igreja Anglicana (Igreja da Inglaterra) em 1724. John continuou na faculdade de Oxford, onde ele era membro do Conselho da Faculdade Lincoln e professor de grego.
Depois de aceitar uma posição de pastor auxiliar em Wroote, Lincolnshire, de 1727 a 1729, Wesley voltou à Oxford não apenas para continuar seus estudos, mas também começar a viver a vida santa. Muitos outros jovens brilhantes tinham um curriculum como o de Wesley, mas poucos tinham a sua dedicação. Ele dominava pelo menos sete idiomas e desenvolveu uma visão verdadeiramente abrangente em todas as áreas da investigação. Quando voltou de Wroote para Oxford, assumiu a liderança de um grupo chamado Holy Club (Clube Santo), iniciado por seu irmão Charles. Aqui, eles buscavam reforçar a fé
através do estudo das Escrituras e medindo a qualidade da santidade da vida de cada membro.
O Holy Club fazia mais que pensar e orar. Eles foram às prisões levar salvação aos prisioneiros. Embora eles fossem ridicularizados por seus companheiros de Oxford, de seu grupo de baixa posição saíram homens que se tornaram importantes para aquele tempo, particularmente os irmãos Wesley e George Whitefield. O seu regime exigia jejuns periódicos, encontros regulares para estudo e auto-exame. Somente muito tempo depois foi que John Wesley percebeu que eles seguiam mais a letra do que o espírito do cristianismo.
Em 1735 grandes mudanças atingiram John e Charles Wesley. O seu pai morreu e ambos foram com o governador Ogilthorpe para a colônia Georgia com a bênção e encorajamento de sua mãe. A Georgia foi uma prova para John, que logrou que realmente não gostava dos índios e que sua rigidez não era muito apreciada pelas pessoas da Georgia. Mas importante que isto, foi o contato de John com uma pequena banda de morávios na viagem para a colônia. Estes homens e mulheres destemidamente cantavam hinos durante terríveis tempestades no mar, enquanto ele se desesperava.
Ele queria conhecer a fé que eles pareciam ter. Em 1738 ele retornou à Inglaterra. O morávio Peter Boehler exerceu grande influência sobre Wesley: pregar a fé até que ele a tivesse, e então ele pregava a fé. Em 24 de maio, uma quarta-feira, em 1738, no famoso encontro de Aldersgate, ele teve uma conversão, uma profunda e inconfundível experiência de fé. Sobre isso John Wesley escreveu:
“Ao entardecer eu fui sem grande vontade a uma sociedade na Rua de Aldersgate, onde alguém estava a
ler o prefácio de Lutero à Epístola aos Romanos. Cerca de um quarto para as nove, enquanto ele estava a
descrever a mudança que Deus opera no coração através da fé em Cristo, eu senti o meu coração estranhamente aquecido. Eu senti que confiava em Cristo, somente em Cristo para a salvação; e uma
certeza foi-me dada que Ele havia retirado os meus pecados, mesmo os meus, e me havia salva da lei do
pecado e da morte.”
Como tinha uma mente livre, John Wesley ainda conseguia retirar os melhores recursos das melhores mentes do seu tempo. William Law, por exemplo, foi seu professor, amigo e mentor por vários anos; mas Wesley achou que um ingrediente importante estava faltando no programa de Law para uma vida devota.
No dia do Ano Novo, 1739, John e Charles Wesley, George Whitefield e mais quatro membros do Clube Santo fizeram uma festa de amor [santa ceia] em Londres.
“Cerca de três da manhã, enquanto estávamos orando, o poder de Deus caiu tremendamente sobre nós,
a tal ponto que muitos gritaram de alegria e outros caíram ao chão (vencidos pelo poder de Deus).
Tão logo nos recobramos um pouco dessa reverência e surpresa na presença da Sua majestade,
começamos a cantar a uma voz: ‘Nós te louvamos, ó Deus;
Te reconhecemos como Senhor’”. – John Wesley
Este evento foi chamado de Pentecoste Metodista. A partir deste dia, um grande avivamento começou. Dentro de um mês e meio, George Whitefield estava pregando para multidões de milhares, com John Wesley fazendo o mesmo dentro de três meses. Com apenas 22 anos de idade, Whitefield começou a pregar ao ar livre.
Os seguidores de Platão conseguiram comunicar a Wesley uma estrutura intelectual que era mais espiritual do que material, mas os hábitos mentais de Wesley estavam moldados tanto pelo modelo de análise de Newton do que pelo platonismo. Os morávios eram o mais perto de uma síntese de todos os elementos que ele desejava e pôde encontrar. Ele até mesmo visitou Herrnhut para saber como sua comunidade trabalhava.
Mas algo também faltava aos morávios, como em todo lugar. Em 1740, ele e seus seguidores romperam com os morávios, mas não antes que ele tivesse aprendido a pregar sermões ao ar livre, o que veio a ser uma parte essencial de seu programa mais tarde.
John Wesley tinha 37 anos de idade quando começou a viajar e pregar. Muitas vezes, as mesmas pessoas que precisaram de sua ajuda eram as mesmas que mais o perseguiam. Ele pregava em púlpitos até que eles fossem fechados para ele, e ele então pregava nos campos abertos. Wesley três vezes por dia, começando às 5 da manhã, uma vez que os trabalhadores poderiam parar para ouvi-lo enquanto andavam para o seu trabalho.
“Eu me coloco em chamas, e o povo vem para me ver queimar” – John Wesley
(respondendo à pergunta de como ele atraía as multidões)
Algumas vezes ele andava 60 milhas (90 quilômetros) por dia a cavalo. As condições do tempo não importavam; ele fazia seu horário e o cumpria, não importavam as dificuldades. John Wesley fugia de uma multidão zangada pulando num lago gelado, nadava para fora dele e continuava a pregar novamente.
John Wesley foi para Gales do Sul em 1741, para o norte da Inglaterra em 1742, Irlanda em 1747, e Escócia em 1751. No total, ele foi à Irlanda quarenta e duas vezes e à Escócia vinte e duas vezes. Houve ocasiões em que ele retornava anos depois de sua última visita e registrava que a pequena sociedade que ele ajudara ainda estava intacta e fiel. Wesley examinava cada membro de cada sociedade pessoalmente para buscar crescimento espiritual e de fé. As sociedades então formadas proviam a organização local para seu movimento.
O ministério de evangelismo do Wesley continuou a crescer, e ele começou a criar “sociedades de avivamento” nos lugares onde ele ministrava. Estes grupos pequenos se reuniam para oração, encorajamento e estudo bíblico.
Wesley pregava limpeza, honestidade, salvação, boas relações familiares, dúzias de outros temas, mas acima de tudo, a fé em Cristo. Ele não pedia aos seus ouvintes para deixarem suas igrejas, mas para continuarem indo nelas. Ele lhes deu o refrigério espiritual que eles não achavam fora do círculo. Quando suas décadas de provação produziram décadas de triunfo, as multidões aumentaram. Ricos e pobres vinham para ouvi-lo falar. Wesley desenvolveu redes de assistentes leigos.
Wesley ensinou tanto pelo exemplo como pelos seus sermões tão medidos. Ele publicou muitos volumes para serem usados em devocionais e direcionou o lucro para projetos, como um local de ajuda para os pobres. Sua vida pessoal estava além de reprovação. Traduziu hinos, interpretou as Escrituras, escreveu centenas de cartas, treinou centenas de homens e mulheres e manteve em seus diários um registro da energia dispensada, que dificilmente tem um rival na literatura ocidental. Sua maneira de falar na linguagem do homem comum teve um impacto imensurável no surgimento do inglês moderno, assim como os hinos de Charles Wesley tiveram um grande impacto na música com suas muitas canções sem mencionar a poesia da subseqüente era Romântica.
“Eu considero todo o mundo como a minha paróquia;
em qualquer parte que eu esteja, eu considero que é certo, correto
e o meu sagrado dever declarar a todos que estejam dispostos a ouvir,
as boas novas da salvação.” – John Wesley
Mas o impacto dos Wesleys nas classes mais baixas foi além de afetar seus hábitos de vida e modo de falar. John Wesley proveu uma estrutura religiosa que era local e pessoal, bem como energeticamente moral. Sua teologia não tirava a liberdade e o direito de ninguém, pois qualquer um podia achar a graça de Deus para resistir ao diabo e ser salvo, se tão somente buscasse e recebesse.
O conservadorismo de Wesley era tanto político como religioso. Ele publicou uma carta aberta às colônias americanas, aconselhando-as a permanecerem leais à Grã-Bretanha, logo antes da Revolução Americana. Ele não tolerava nenhuma conversa sobre agitação civil na Inglaterra.
John Wesley morreu em 2 de março de 1791, cerca de três anos depois que seu irmão Charles morreu. Até seus anos finais, ele fez a mesma frase de abertura em seu diário a cada ano no seu aniversário, agradecendo a Deus por sua longa vida e sua
contínua boa saúde, afirmando que sermões pregados de manhã cedo e muita atividade ao ar livre o mantiveram em forma para a obra de Deus.
A seguinte frase foi escrita em seu diário em 28 de junho de 1774:
“Sendo hoje meu aniversário, o primeiro dia do septuagésimo segundo ano, eu estava pensando, Como
pode ser isso, que eu ache a mesma força que tinha trinta anos atrás? Que a minha vista esteja consideravelmente melhor agora, e meus nervos mais firmes do que eram antes? Que eu não tenha nenhuma
enfermidade da velhice, e não tenha mais aquelas que tive na juventude? A grande causa é, o bom prazer de Deus, que faz o que lhe agrada. Os meios principais são: meu constante levantar às quatro da madrugada, por
cerca de cinqüenta anos; o fato de geralmente pregar às cinco da manhã, um dos exercícios mais saudáveis do mundo; o fato de que nunca viajo menos, por mar ou terra, do que 4500 milhas (6.750 km) por ano.”
A TEOLOGIA DE JOHN WESLEY
“Não será esta outra das razões pela qual se torna tão difícil aos ricos entrarem no Reino dos Céus?
A grande maioria deles está debaixo de maldição, sob a maldição particular de Deus por que…
Não roubam unicamente a Deus, mas também ao pobre, ao faminto e ao despido…
e se tornam culpados por toda a necessidade, aflição e dor
que poderiam eliminar, mas não o fazem”. – John Wesley
A identidade de John Wesley como teólogo prático, leva em consideração a identidade histórica da Teologia Prática e o contexto teológico presente na Inglaterra do século XVIII. A abordagem teológica de Wesley localiza-se no meio dos parâmetros da Teologia Moral, Popular e Pastoral daquela época. Destaca-se a dificuldade de localizar a teologia de Wesley dentro das categorias teológicas vigentes, no seu contexto histórico, devido à sua preocupação com a integração da teoria e prática.
Está relativamente claro que John Wesley não se considerava Teólogo Sistemático e as discussões atuais geralmente o localizam na categoria de Teólogo Prático. A Teologia Prática, em comparação com a Teologia Sistemática, é freqüentemente entendida como sendo menos acadêmica e mais orientada para a prática ministerial.
OBRAS DE JOHN WESLEY
SERMÕES
John Wesley editou os seus sermões em dois momentos: logo depois do início da fase mais evangelista e da formação do movimento metodista, e mais tarde, a partir de 1778, no Arminian Magazine, revista editada por ele até o ano da sua morte, em 1791. Desses sermões, os primeiros 53 compõem, na tradição norte-americana do metodismo, os Standard Sermons, conjunto reduzido a 52 sermões na versão brasileira. O metodismo inglês, porém, mantêm uma lista ligeiramente diferenciada dessa coletânea num total de 44 sermões. A importância dessa primeira coletânea de sermões está no fato de
que ela foi usada na história do metodismo para definir o perfil doutrinal do movimento na Inglaterra, quando uma das sociedades religiosas metodistas aceitou somente pregadores com esse perfil.
Hoje em dia, valorizam-se também cada vez mais os sermões da segunda fase da vida ativa de Wesley como marcas doutrinárias. Sem abandonar o foco pessoal, Wesley amplia agora a visão do movimento e aborda temas incluindo a criação, a trindade, zelo cristão, os perigos da riqueza etc.
NOTAS EXPLICATIVAS DO NOVO TESTAMENTO
As Notas explicativas sobre o Novo Testamento foram publicadas pela primeira vez em 1754.
Wesley consultou para esta obra o “Gnomon” de Johann Albrecht Bengel (1687- 1752), um comentário do Novo Testamento publicado pela primeira vez em 1712. Para a interpretação da Revelação, Wesley usa ainda um outro livro de Bengel, a sua Explicação da Revelação (Erklärte Offenbarung). O texto tem alguns problemas, especialmente a sua previsão do fim do mundo para 1836, que causou dificuldades nas sociedades metodistas.
No prefácio do livro da Revelação de João, Wesley tinha comentado que ele não defenderia cada parte do texto, mas isso não era o suficiente. Em duas cartas do ano 1788 Wesley interpreta: Bengel não falou do fim do mundo, mas do início do milênio.
Há mais um segundo desafio de interpretação. Wesley integra em seu comentário o texto da Bíblia King James de 1611 (também chamada a versão autorizada). Porém, Wesley nem sempre segue o texto. Em vez disso, oferece, por vezes, uma tradução própria.
NOTAS EXPLICATIVAS DO ANTIGO TESTAMENTO
Menos conhecidas são as Notas explicativas do Antigo Testamento, publicadas em 1765. Wesley baseia este comentário na obra de Mathew Henry.
AS CARTAS
Hoje encontra-se uma grande parte das cartas escritas por John Wesley na internet.
O DIÁRIO
John Wesley publicou em etapas um volumoso diário, mas manteve também um diário pessoal. Do primeiro, o princípio de seleção de textos segue mais uma lógica avivalista e exclui as tendências sociais. Ela somente servirá até que edições mais
abrangentes estejam acessíveis. O diário nos familiariza com o cotidiano do trabalho de Wesley, mas não pode ser esquecido que o primeiro objetivo não foi descritivo, mas explicativo, se não apologético.
BIBLIOTECA CRISTÃ
A Biblioteca Cristã (1750) foi composta originalmente por 50 livros. O textor e produz livros de mártires, cartas dos pais da igreja, biografias e textos de diversos autores, muitas vezes abreviados pelo próprio Wesley. O número de confissões contempladas (puritanos – maioria -, anglicanos, luteranos, calvinistas, católicos,) faz dessa coletânea uma prova da visão ecumênica de John Wesley. Apesar disso, Wesley fala aqui mais mediante seleção, pelo abreviamento e pelas mudanças nos textos (por exemplo: “santificação” em vez de “divinação” no texto de Marcarios).
COMPÊNDIO DA FILOSOFIA NATURAL
O Compêndio da Filosofia Natural (1775) de John Wesley introduz as descobertas das ciências naturais. Wesley popularizou seu conteúdo também no seu Arminian Magazine. O título “Visão geral da sabedoria de Deus na criação” mostra a tentativa de unir a “piedade vital e o conhecimento” (segundo uma canção de Charles Wesley escrita para a inauguração da escola Kingswood).
EXPLICAÇÃO DA PERFEIÇÃO CRISTÃ
Nessa obra de 1777, Wesley enfatiza a continuidade do seu pensamento entre 1725 e 1777 e descreve como eixo temático a santificação e perfeição cristã.
O CARÁTER DE UM METODISTA
Este texto, publicado pela primeira vez em 1739, descreve o metodismo como religião bíblica e integrada na sociedade inglesa da sua época.
UMA PALAVRA PARA OS CLÉRIGOS
Este texto de 1756 estabelece um diálogo com os presbíteros anglicanos ordenados. Por um tempo, Wesley esperava criar uma aliança mais ampla do cristianismo inglês para desenvolver a sua missão com mais força.
PENSAMENTOS SOBRE ESCRAVIDÃO
O texto de 1774 se baseia, em grande parte, num texto de Anthony Benezet, um Quaker (Sociedade de Amigos). O testemunho, porém, é claramente mantido: Wesley considera essa instituição da escravidão, na sua época, até mais desumana do que na época do Império Romano.
MANUAL DE MEDICINA POPULAR
Este manual surgiu pela primeira vez em 1747. Wesley tentou atender às necessidades do povo quanto a remédios e tratamentos. A qualidade desta obra, inúmeras vezes reeditada, não foi sempre aceita pelos médicos da época, porém Wesley defendeu o seu conteúdo como aprovado pela práxis e mudou partes na base de novas evidências.